1.5.09

357 milhões

According to the election commission, the voting percentage recorded till evening remained in Uttar Pradesh (45 %), Bihar (48 %), Madhya Pradesh (44 to 45 %), Karnataka (57%), Maharashtra (43 to 45 %), Gujarat (49 to 50 %), Jammu and Kashmir (30 %), West Bengal (for first phase 64%) Sikkim (till last reports 60 %).
Fala-se muito da "maior democracia do mundo", sua impressionante participação eleitoral, da mobilização política de novos grupos sociais, do democratic upsurge, das novas gerações de eleitores (1 milhão de novos votantes nestas eleições) etc., etc. Tudo verdade e muito interessante.

Mas cá estão indicadores de que a democracia indiana sofre dos mesmos flagelos que afectam as democracias europeias, embora por razões diversas. A terceira fase das eleições (e são nacionais, não umas europeias ou um referendo qualquer num dia de praia em Junho...) registou menos de 50% de participação eleitoral.

Nas eleições de 2004 a abstenção ultrapassou os 40%. Com os resultados desta terceira fase (em que se incluem alguns dos maiores estados indianos), é possível que este valor se aproxime desta vez dos 50%. Isto é, em cada dois indianos com capacidade de voto, só um exerce esse direito. Nesse sentido, talvez este blogue se devesse chamar "357 milhões".

The middle finger

A Índia tem destas coisas em que a sofisticação pós-moderna coabita com a tradição medieval: Vota-se integralmente de forma electrónica, num dos sistemas mais avançados do mundo, mas para evitar fraudes e eleitores duplos, o dedo de cada votante é marcado com uma tinta permanente (ou quase - aguenta umas boas semanas). Tal como na imagem de topo deste blogue.

Por norma, a marca era no dedo indicador. Mas parece agora que, para se armarem em engraçados, alguns começaram a pedir que fosse no dedo do meio. Como no caso destas estrelas de Bollywood, incluindo o semi-divino ícone Amitabh Bachchan (ao meio):

1 de Maio



Estranhamente, na Índia o Dia do Trabalhador não é feriado. Trabalha-se como em qualquer outro dia, um dia após a terceira fase das eleições nacionais.

30.4.09

Ainda sobre os Gandhi

Escrevi este artigo sobre os Gandhi, que saiu hoje no Público.

A terceira fase

Decorreu hoje a terceira fase das eleições. Aparentemente, e apesar da anunciada mobilização em Bombaim devido aos ataques terroristas, o centro económico da Índia votou pouco. A ronda de hoje era considerada decisiva para o Congresso e o BJP. Se foi ou não saber-se-á a 16 de Maio.

28.4.09

Fragmentação

Em poucas linhas, o pensador Ashgar Ali Engineer (ver este post sobre as origens destes nomes anglófonos) narra de forma sucinta e elegante o que se entende por fragmentação do sistema partidário indiano:
Since the late 1980s, the Indian population has been polarised like never before. During all those years Congress was ruling, it was a sort of umbrella organisation trying to carry certain castes and communities with it. But not all castes and communities were getting justice, so other parties came into existence. You see it’s 60 years of our democracy and each election brings more and more political awareness among the people … All politicians make promises to Christians, to Dalits, etc. When the promises are not fulfilled, then some regional parties come into existence. (entrevista completa)

Cíber-democracia

Mais de um milhão de EVMs - as Electronic Voting Machines - encontram-se em acção durante estas eleições. Poupa o ambiente, impede fraudes diversas, e facilita o processo de contagem. Pelo menos até um belo dia em que um bug de Bangalore (ou um vindo do outro lado dos Himalaias...) penetrar o sistema...

Para quando um sistema destes em Portugal, para além dos teste pontuais? A seguinte garantia da Comissão Eleitoral indiana é particularmente reassuring: "Since EVMs work on a 6-volt battery, there is absolutely no risk of any voter getting an electric shock." Os eleitores agradecem.

Third Front

Patna (PTI): New fronts have emerged after every general election since 1996 and a new non-Congress front comprising secular parties would come up after the ongoing Lok Sabha elections also, CPI(M) Politburo member Sitaram Yechury said on Tuesday.
A Terceira Frente não conta, essa é uma das poucas certezas que se pode ter sobre a situação política indiana. Por mais força que, formalmente, possa agora aparentar, fragmentar-se-á no minuto seguinte ao anúncio dos resultados, no dia 16 de Maio. Não é mais do que um aglomerado sui generis de partidos políticos que não partilham absolutamente nada, pelo contrário, divergem fundamentalmente: de comunistas e regionalistas, a tribais e ex-aliados dos nacionalistas do BJP.

Claro que a Yechury convém salientar a utópica possibilidade de a Third Front formar governo, porque é a única forma de o CPI(M) realizar a sua ambição de liderança num sistema crescentemente bipolarizado.

Yechury fala da frente alternativa para evitar também comentar um cenário bem mais possível: os comunistas voltarem a apoiar Manmohan Singh e/ou o Congresso, um ano depois de terem batido com a porta, em choque com a aproximaçao estratégica aos Estados Unidos.

Ayodhya


Às vezes acontece um jornalista escrever que "uma mesquita do século XVI foi destruída por milhares de hindus" e não pensar muito na "mesquita do século XVI", mas quase só na violência que se seguiu. Neste caso, trata-se da mesquita de Babri, em Ayodhya. Vale mesmo a pena pensar nela. Tornou-se tema recorrente em campanhas eleitorais, uma vez que foi o líder do BJP e actual candidato a primeiro-ministro, L.K. Advani, quem organizou o movimento para a construção de um templo hindu no seu lugar, com os resultados que se sabe. 

Eleições em cartoon

Cartoon de 1999, em que Laloo Prasad Yadav (Rashtriya Janata Dal), do estado de Utar Pradexe (180 milhões de habitantes), ainda era visto como um goonda, um fora-de-lei, campónio analfabeto e rude. Hoje tem uma das pastas ministeriais mais importantes (Indian Railways) do Governo federal de Singh e é recebido de braços abertos como um managment guru nas escolas de gestão da Índia e no resto do mundo.

Centrão

A sondagem do India Today que a Francisca Gorjão Henriques refere, bem como a do instituto CSDS (ligação no comentário do post), são demonstrativas do alargamento de um espaço ideológico moderado, de consensos, crescentemente partilhado pelo BJP e pelo Congresso, os dois partidos de governo de um sistema crescentemente bipolar.

Noutros comentários à imprensa, sublinhei que este espaço de consenso é especialmente visível em dois de três dimensões governamentais. Nos campos da economia e da política externa, tanto o Congresso como o BJP partilham, no geral, as mesmas orientações: aceleração das reformas de mercado, integração na economia global, trocas comerciais para acelerar a integração regional; e aproximação aos Estados Unidos, projecção de poder militar extra-regional, engagement com a China e containment do Paquistão.

Fundamentalmente, a intelligentsia de ambos partidos partilha os mesmos valores, a mesma educação, e a mesma moderação que é vital para se poder liderar em segurança um país tão diverso como a Índia. Esta continuidade, e alargamento do "centrão" ideológico indiano, explica-se também com o facto de o real poder de decisão económica e externa estar nas mãos dos burocratas, os quadros do Indian Administrative Service. Na Índia a classe política faz política no sentido reduzido do conceito - fala, ovaciona, negoceia, passeia. Quem governa são os burocratas, e esses convergem para além da ideologia.

A terceira dimensão, social, político-cultural e doméstica, tem sido foco de tensão e diferenças entre ambos os partidos, é verdade. Afinal, o BJP tem uma agenda nacionalista, religiosamente fundamentada. E o Congresso é um partido com DNA socialista, secularista. Mesmo aqui, no entanto, ambos partilham uma missão fundamental: a estabilidade e segurança interna. Nesse sentido, o BJP (um partido de classe média, comerciantes e funcionários públicos), embora refém das alas mais radicais do Sangh Parivar, a familia das organizações nacionalistas hindus, não se distancia assim tanto do Congresso. Ou não teria conseguido cumprir um mandato inteiro (1999-2004), com menos instabilidade e ameaças à segurança interna do que o governo de Singh tem enfrentado, desde então.

27.4.09

Os temas que preocupam os indianos

O India Today traz uma sondagem sobre os temas que preocupam os indianos (terrorismo muito à frente dos outros, seguido pela corrupção é só depois a situação económica) e quem melhor os poderá resolver. Não há muitos pontos a distanciar o Congresso do BJP, mas o partido da dinastia Nehru-Gandhi leva a dianteira. A chamada "terceira frente", um casamento por conveniência de vários partidos regionais e de esquerda, parece interessar pouco aos eleitores.

Quem mais vota

Ao contrário de muitas zonas do mundo, as eleições indianas têm visto aumentar a sua participação. E não por parte da classe média urbana, mas da população mais pobre e rural. Os níveis de afluência às urnas ou estabilizaram, ou aumentaram, provando que os indianos estão bastante ligados à política. O cientista político Yogendra Yadav diz que a percentagem de pessoas filiadas num partido, ou que se identificam com um partido, é maior na Índia do que em muitas outras democracias europeias ou na americana. O Asia Times Online fala também sobre isso neste artigo.

Terra dos sapatos voadores

Shoe hurled at Prime Minister in Ahmedabad
AHMEDABAD: A youth hurled a shoe at Prime Minister Manmohan Singh at a public meeting here on Sunday (aqui).

E um à parte, sobre a dimensão dos comícios eleitorais indianos: "Though a public meeting, it was meant for only a restricted audience on security grounds. Only a few thousand invited guests of the Congress leaders were allowed". Está visto que, na Índia, uma assistência limitada (restricted) equivale a "uns poucos milhares".

26.4.09

Trouble in Tamil Nadu

Chennai (IANS) PMK leader S. Ramadoss on Sunday described Tamil Tigers supremo V. Prabhakaran as a "freedom fighter" and compared him to former South African president Nelson Mandela, Palestine leader Yasser Arafat and Indian freedom fighter Subash Chandra Bose. (aqui)
O PMK, embora seja um partido regional (Tamil Nadu), não é u
m partido marginal ou extremista. Esteve por diversas vezes aliado ao Congresso e integrou a coligação governamental (UPA) de Manmohan Singh até ao mês passado.

O que leva, então, o supostamente "indiano" e "moderado" PMK a comparar Prabhakaran, o líder dos "tigres" LTTE do Sri Lanka, a Mandela, Arafat e Bose? Mero oportunismo eleitoral, diriam alguns, tendo em conta as eleições que se realizam naquele estado no próximo dia 13. Também o é. Mas se solidariedade com a causa (e método) dos LTTE faz ganhar votos no Tamil Nadu, isso significa que há aqui um problema muito grave para Nova Deli.


No fundo, não é nada de novo. Há décadas que os tâmiles indianos apoiam o movimento separatista e a (agora designada pelos EUA e UE) "organização terrorista" dos seus co-étnicos insulares, LTTE. A situação é agravada por dezenas de milhares de refugiados tâmiles que têm chegado da ilha nos últimos anos, e se encontram em campos ao longo da costa indiana.

O problema é que esta ofensiva final do exército do Sri Lanka contra Prabhakaran coincide com o período eleitoral na Índia. E partidos indianos do Tamil Nadu, como o PMK, e a classe política tâmil-indiana em geral, não hesitam agora em capitalizar o que designam de "genocídio" e a radicalizarem os seus discursos pró-LTTE: ainda no Sábado a carismática Jayalalitha (ADMK, também na oposição) defendeu abertamente o "Tamil Eelam" (independência para os tamiles ceiloneses) como a única solução para o conflito.

Esta radicalização do discurso político no Tamil Nadu a favor do LTTE vem provar (e, no pior dos casos, activar) um latente sentimento de solidariedade que os tâmiles indianos nutrem pelos tâmiles ceiloneses, do outro lado do Estreito de Palk, que separa a Índia do Sri Lanka. Há meses que procuram pressionar o governo de Manmohan Singh a intervir no conflito e a forçar Colombo a um cessar-fogo.

É por isso mesmo que consta que a principal missão do enviado especial de Nova Deli ao Sri Lanka é a de procurar convencer Colombo a adiar a "estocada final" no LTTE até depois de as eleições se realizarem no Tamil Nadu, no próximo dia 13 de Maio.

Election Train

Soutik Biswas iniciou ontem, Sábado, uma viagem de oito mil quilómetros pela Índia, para acompanhar as eleições indianas para a BBC. É o BBC India Election Train.

"Ordinarily resident"

The last time Vishnu Tavudu went to the polling booth was 26 years ago. ... He is one among several thousand migrant labourers living in makeshift camps along Chennai’s famed IT Expressway, who are most likely to be left out of the electoral process. (aqui)
Estes trabalhadores de Chenai não votam. Tendo em conta que a época de Abril a Junho é a que em as migrações internas na Índia atingem o seu pico, é estimado que vários milhões de indianos não possam exercer o seu direito de voto nestas eleições. Vivem em tendas, ou mesmo ao ar livre, sem "residência oficial".

Num documento legislativo, o seguinte parecer da Comissão de Eleições indiana, sobre a definição e entendimento de "ordinarily resident", critério constitucionalmente essencial para que um cidadão indiano se possa recensear eleitoralmente no círculo de que é natural (daqui):

"A person is said to be ordinarily resident in a place if he uses that place for sleeping."

"On the other hand even persons living in sheds, and persons living on pavements without any roof are eligible for enrolment provided they are ordinarily resident in the sheds or on pavements in a particular area, do not change the place of residence and are otherwise identifiable."

O sistema eleitoral indiano está cheio de incongruências, incluindo este muito ambíguo "ordinarily resident" que exclui também todos os eleitores da diáspora - não há nenhum método de voto à distância, embora começe a haver propostas e pressão de certos partidos e sectores da diáspora para estender o voto electrónico às missões diplomáticas indianas. Presentemente, no actual sistema, a Índia exclui do seu processo eleitoral entre 5 e 10 milhões de cidadãos que residem no exterior.